Na madrugada de 27 de janeiro de 2013, um incêndio atingiu a boate Kiss, em Santa Maria, na região central do Rio Grande do Sul, deixando 242 mortos. À época, como resposta à comoção popular, montou-se na Câmara dos Deputados uma comissão especial para propor melhorias na legislação que trata, especialmente, dos alvarás de funcionamento de casas noturnas e estabelecimentos em ambientes fechados.
Quatro anos após a tragédia, a Lei Kiss ainda espera por aprovação no Legislativo. O projeto de lei (PL) 2.020, que já tramitava desde 2007, foi aprovado na Câmara ainda no ano do incêndio. Em 2015, já no Senado, o texto recebeu quatro alterações, que desde então aguardam por nova aprovação dos deputados para que o texto possa ser encaminhado para sanção presidencial.
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) disse que encaminhou um requerimento ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), pedindo que a Lei Kiss seja o primeiro projeto a ser votado em 2017, no retorno da atividade legislativa. “É preciso que o Congresso tenha a sensibilidade de entender a expectativa que existe por parte da sociedade”, afirmou Pimenta, que é natural de Santa Maria e coordenou a comissão especial na Câmara para avaliar a tragédia.
Segundo o deputado, o PL 2.020/07 estabelece um padrão nacional para emissão de alvarás e de projetos de prevenção de incêndios, que são de responsabilidade das prefeituras e dos estados, respectivamente. “Em qualquer lugar do Brasil vai haver um patamar mínimo de exigência. Hoje em dia, cada cidade e estado tem uma legislação diferente, o que dificulta a fiscalização”, explicou Pimenta.
O presidente da Câmara garantiu, por meio da assessoria de imprensa, que há, da parte dele, compromisso para que a votação da Lei Kiss seja priorizada em 2017.
Outra proposta motivada pela tragédia em Santa Maria é o PL 4.923/2013, apresentado uma semana após o incêndio pela então deputada Nilda Gondim (PMDB-PB). O projeto também prevê mais rigor para a liberação de alvarás e estabelece obrigações a serem cumpridas pelos proprietários de estabelecimentos que funcionam em ambientes fechados. Aprovada pelas comissões, esta proposta aguarda apreciação do plenário da Câmara desde maio de 2015.
Lei estadual
Foto: Nabor Goulart/Agência
No mesmo ano da tragédia, o Rio Grande do Sul ganhou sua própria Lei Kiss: a Lei Complementar 14.376. Em agosto do ano passado, no entanto, os deputados gaúchos aprovaram alterações no texto da lei para ampliar o prazo de validade dos alvarás de Prevenção e Proteção contra Incêndio (APPCI) e reduzir a frequência das inspeções nos estabelecimentos que funcionam em ambientes fechados.
As mudanças na lei estadual foram criticadas pela Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), que entendeu ter havido uma flexibilização da Lei Kiss estadual. A própria lei é vista como ineficaz pelo presidente da associação, Sérgio da Silva.
“A Lei Kiss é a coisa mais absurda que fizeram. Criaram ela apenas para dar uma satisfação à sociedade. Ela foi copiada de São Paulo, mas aqui na Assembleia Legislativa, os prefeitos e empresários acabaram com ela, tiraram toda a parte mais rígida que a lei continha”, afirmou o presidente da associação. No incêndio da boate Kiss, ele perdeu o filho Augusto Sérgio Krauspenhar da Silva, que na época tinha 20 anos de idade.
A tragédia
O incêndio na Boate Kiss foi provocado por um sinalizador acionado por um dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, que se apresentava no local. O fogo do artefato atingiu a espuma acústica que cobria o teto da casa e rapidamente uma fumaça tóxica tomou conta do ambiente.
O pânico generalizado e a falta de saídas de emergência impediu que as cerca de 1,5 mil pessoas presentes deixassem a boate em segurança. A maioria das 242 vítimas era de jovens universitários de seis cursos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) que estavam promovendo a festa. Outras 680 pessoas ficaram feridas ou tiveram complicações respiratórias por terem inalado a fumaça tóxica.
Ainda em 2013, o inquérito da Polícia Civil gaúcha sobre o caso indiciou 16 pessoas e apontou outras 12 como responsáveis pela tragédia. O Ministério Público, no entanto, denunciou quatro pessoas por homicídio: os donos da boate Kiss, Mauro Hoffmann e Elisandro Spohr; e dois integrantes da banda, Marcelo dos Santos e Luciano Leão. Os quatro aguardam julgamento em liberdade.
Na Justiça Militar, foram condenados o então comandante do 4º Comando Regional dos Bombeiros, Moises da Silva Fuchs, e o capitão Alex da Rocha Camilo, que em 2013 era chefe da Seção de Prevenção a Incêndios. Ambos foram condenados por inserção de informação falsa em documento público. O tenente-coronel Daniel da Silva Adriano, que assinou o alvará de funcionamento da boate Kiss, foi absolvido.
Redação/EBC