Um terço dos 29 mil presos do Paraná estão amontoados nas 174 cadeias

SUPERLOTAÇÃO - Distribuição de vagas e presos por regionais em delegacias e cadeias da Polícia Civil - posição em 25/11/2016

SUPERLOTAÇÃO -  Distribuição de vagas e presos por regionais em delegacias e cadeias da Polícia Civil - posição em 25/11/2016 Fonte: Mapa Carcerário do Estado do Paraná/Depen

Um terço dos 29 mil presos do Paraná estão amontoados nas 174 cadeias e carceragens de delegacias, em condições insalubres e degradantes, e sem acesso a qualquer política de ressocialização. Essa é a principal conclusão de estudo sobre o sistema carcerário, realizado pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná e divulgado nesta terça-feira (4 de abril) pelo presidente, conselheiro Durval Amaral, e pelo coordenador-geral de Fiscalização, Mauro Munhoz. "Essa condição de total desumanidade impacta diretamente a questão da segurança pública no Estado", declarou Durval.

O levantamento servirá de base para auditoria integrada que o TCE-PR fará no sistema a partir de agora, dentro de seu Plano Anual de Fiscalização (PAF) de 2017. O prazo de conclusão do trabalho é de seis meses. Durante entrevista à imprensa, para apresentar o estudo, Durval anunciou outras duas medidas. A primeira é a elaboração, em caráter de urgência, de um plano estratégico para o sistema carcerário do Paraná, incluindo Governo do Estado, Tribunal de Justiça, Ministério Público e Defensoria Pública. "Já fiz contato com os chefes dessas instituições e a ideia foi muito bem recebida", informou Durval.

A outra medida imediata recomendada pelo TCE-PR é que o governo estadual redirecione recursos do empréstimo de US$ 112 milhões, concedido pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para a construção de penitenciárias. O objetivo atual de destinação desses recursos é a modernização das cadeias públicas e compra de equipamentos para a Polícia Civil do Paraná.

Superlotação de cadeias e delegacias

O Mapa Carcerário, elaborado pelo Departamento Penitenciário do Estado (Depen), órgão vinculado à Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp), aponta que, na última consolidação de dados, em 25 de novembro de 2016, o Paraná possuía exatos 28.974 presos. Desse total, 19.237 estavam nos 33 presídios mantidos pelo Depen e 9.737 (33,6%) se amontoavam nas 174 cadeias e delegacias, distribuídas nas nove divisões regionais, sob a custódia da Polícia Civil.

Com capacidade para 4.417 detentos provisórios, as cadeias e delegacias tinham, naquela data, 5.320 presos além do que podiam comportar. Sua taxa de ocupação alcançava mais de 2,2 vezes a quantidade de vagas disponíveis. O indicador mais grave de superlotação estava na região de Londrina, com 2.398 presos além da capacidade. Embora menos grave, o excesso de presos também se verificava nas 33 penitenciárias, espalhadas por todas as regiões do Estado. Com 18.103 vagas para os regimes fechado e semiaberto, esse sistema apresentava, em novembro passado, deficit de 1.134 vagas.

Prejuízo à atividade policial

Com base em informações do Ministério da Justiça, a equipe do TCE-PR que elaborou o estudo concluiu que a situação paranaense, de manter grande quantidade de presos em cadeias e carceragens de delegacias - muitas delas interditadas há anos pela Justiça -, é atípica, não verificada nos outros Estados. A possível causa dessa situação apontada pelo estudo é o "represamento" de detentos, provisórios e eventualmente até já condenados, nessas estruturas precárias, devido à falta de vagas nas penitenciárias. "Essa situação configura infração à legislação de execução penal", afirmou o coordenador-geral de Fiscalização do TCE-PR. Segundo o último levantamento disponível, de 2010, 30% dos presos que estavam em delegacias já haviam sido condenados.

O estudo apontou que a necessidade de executar um trabalho que não é dela prejudica o cumprimento legal das obrigações da Polícia Civil. Enquanto investigadores, escrivães e delegados, em desvio de função, se ocupam da custódia e remoção de presos de delegacias e cadeias superlotadas, contrariando a legislação de execução penal, deixam em segundo plano a investigação de crimes e a conclusão de inquéritos. O problema é potencializado pela falta de servidores, já que o último concurso para os cargos de investigador e escrivão ocorreu em 2010 e, para delegado, em 2013.

Além da responsabilidade direta do governo estadual, gestor do sistema, o estudo aponta que a falta de integração e falhas de outros órgãos contribuem para agravar a situação. A equipe apontou, por exemplo, que uma dessas falhas é a falta de determinação clara, pelo Poder Judiciário, nos mandados de prisão preventiva expedidos pelas varas de execução penal, do sistema prisional para o qual o preso deverá ser obrigatoriamente conduzido.       

Impossibilidade de ressocialização

 Um terço dos presos não tem acesso a qualquer política de ressocialização. Superlotadas e sem infraestrutura adequada, as delegacias e cadeias não têm condições de oferecer atividades de ensino ou trabalho. Mesmo nas penitenciárias, os índices de atendimento a esse direito não ultrapassam um terço dos 19.210 presos.

Em dezembro de 2016, 6.076 detentos participavam de atividades educacionais, o que correspondia a 31,63% da população total dos presídios. Mas se forem mantidas apenas as atividades de ensino (fundamental, médio, técnico e superior), excluindo-se atividades de redução de pena por meio da leitura, na qual está inserida a maior parcela dos beneficiados (2.721 pessoas, ou 14,16% do total), a participação cai para apenas 17,46% do total (3.355 presos).

Quanto às oportunidades de trabalho oferecidas pelo Depen, o estudo do TCE-PR constatou que elas beneficiam menos de um quarto dos encarcerados. Em dezembro, 4.700 ocupantes de presídios (24,28% dessa população) exerciam atividades laborais na limpeza, manutenção, auxílio a atividades educacionais, artesanato e produção de alimentos para consumo nos próprios presídios. Desse grupo, 1.439 integrantes trabalhavam em canteiros de produção instalados por meio de convênios firmados entre o Depen e outros órgãos públicos ou empresas privadas. E apenas 59 detentos estavam autorizados pela Justiça a trabalhar em empresas, sob as regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Prioridade da fiscalização

A fiscalização do sistema carcerário do Paraná foi definida como prioridade pelo conselheiro Durval ao tomar posse como presidente do TCE-PR, em 12 de janeiro. Para o estudo preliminar, ele designou oito servidores. Coordenada pela analista de controle Denise Gomel, a equipe possui integrantes da Terceira Inspetoria de Controle Externo (3ª ICE), atualmente responsável pela fiscalização da Sesp, e da 7ª ICE, que fiscaliza outros órgãos direta ou indiretamente ligados à questão carcerária, como o Tribunal de Justiça, o Ministério Público Estadual e as secretarias de Educação e de Saúde.

Ao longo de dois meses de trabalho, a equipe realizou estudos, pesquisas, entrevistas, reuniões e visitou duas delegacias que alojam presos: a Primeira Delegacia Regional de São José dos Pinhais e o Oitavo Distrito Policial de Curitiba.  O trabalho do Paraná vai integrar auditoria nacional no sistema prisional, coordenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), da qual participam outros 21 órgãos de controle brasileiros.

Fonte: TCE/PR

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